Devido à expansão dos meios eletrônicos e da internet, cada vez mais pessoas realizam atividades do cotidiano no ambiente virtual, como compras e vendas de mercadorias e contratação de serviços.
O sucesso do comércio digital se deu principalmente devido aos benefícios para ambas as partes, vendedores e compradores,por conta da quebra de barreiras espaciais, custos menores para venda e aquisição em relação a estabelecimentos físicos, comodidade, rapidez e maior variedade.
Desse modo, para aproveitar todos esse benefícios de forma segura, é essencial conhecer as peculiaridades dos contratos eletrônicos.
Pensando nisso, preparamos esse artigo explicando o que é um contrato eletrônico, quais são seus requisitos legais de validade, a legislação que lhe é aplicável e os mecanismos que podem ser utilizados para conferir maior segurança jurídica às partes.
O QUE SÃO OS CONTRATOS ELETRÔNICOS
Os contratos eletrônicos são instrumentos jurídicos que estabelecem direitos e deveres entre os contratantes por meio da transmissão de dados via internet. Buscam proporcionar segurança às partes que acordam sobre determinado objeto.
Tais contratos, como o próprio nome sugere, são formalizados através do meio eletrônico. A manifestação da vontade das partes deve ocorrer de forma virtual, caso contrário, o contrato não será eletrônico.
Dessa forma, mesmo que o contratante tenha conhecimento da oferta por um outdoor ou panfleto, por exemplo, desde que manifeste sua aceitação por meio virtual, o contrato será eletrônico.
Por outro lado, se a parte toma conhecimento da proposta de um serviço através do e-mail ou rede social, por exemplo, mas a ela aquiesce pessoalmente, não se tratará de um contrato eletrônico.
Ademais, é importante ressaltar que o negócio jurídico firmado eletronicamente, desde que preenchidos todos os elementos essenciais à caracterização do contrato, bem como atendidos os seus requisitos de validade, conforme exposto a seguir, enseja as mesmas responsabilidades que incidiriam sobre os contratantes se o contrato fosse físico.
CLASSIFICAÇÃO
Os contratos eletrônicos se classificam quanto ao grau de interação dos contratantes com o aparelho eletrônico no momento da celebração do acordo. Vejamos:
- 1. Interpessoais: essa modalidade de acordo ocorre, de fato, entre as partes, o aparelho eletrônico apenas possibilita a comunicação para celebração do contrato. Os contratantes declaram diretamente suas vontades, sem respostas automatizadas;
- 2. Intersistêmicos: a contratação é feita entre sistemas automatizados, por meio de aplicativos programados, ou seja, não há ação humana;
- 3. Interativos: é a forma de contratação mais utilizada no comércio eletrônico, consiste na comunicação entre uma pessoa e um sistema automatizado. Os contratos interativos são por sua natureza contratos de adesão;
- 4. Mistos: contratos que possuem mais de uma característica de classificação.
REGULAMENTAÇÃO
A legislação brasileira não regula expressamente os contratos eletrônicos, motivo pelo qual são chamados de “atípicos”. Isso não quer dizer que esses contratos são proibidos.
Pelo contrário, eles podem ser concluídos desde que obedeçam a todas as regras gerais e princípios previstos aos demais contratos, haja vista aqueles se diferenciam destes apenas em relação à forma pela qual são firmados.
Princípios da Contratação Eletrônica
A análise dos princípios que regem a contratação é fundamental, haja vista que eles têm o papel orientador tanto no momento da elaboração das leis quanto na sua aplicação, orientando ainda as partes durante a celebração dos negócios jurídicos.
Conforme mencionado, os contratos eletrônicos são regidos pelos mesmos princípios que norteiam as contratações em geral. São 5 os principais princípios:
- 1. princípio da autonomia da vontade – Consiste na liberdade das partes em celebrar o contrato. As partes podem estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses. É a possibilidade de contratar e de aderir ao contrato que se entende pertinente. Tal liberdade, entretanto, encontra limitações, pois precisa estar em conformidade com o ordenamento jurídico;
- 2. princípio da obrigatoriedade da convenção – Determina que as partes cumpram o que foi contratado sem a possibilidade de alterações, exceto se houver concordância mútua para tal ou se tratar de caso especial ou extraordinário, como na escusa por caso fortuito ou força maior, por onerosidade excessiva para uma das partes ou mesmo em revisões judiciais por diversas razões;
- 3. princípio do consensualismo – em regra, o simples acordo de vontades é suficiente para validar um contrato, ou seja, não precisa de qualquer formalidade especial; porém existem casos em que a lei prevê o cumprimento de certas formalidades/solenidades para a plena eficácia do contrato;
- 4. princípio da relatividade dos efeitos do contrato – esse princípio liça que o contrato só gera efeito entre os contraentes, não alcançando terceiros, seja beneficiando, seja prejudicando;
- 5. princípio da boa-fé objetiva – previsto expressamente no Código Civil, esse princípio impõe às partes o dever de agir com lealdade, honestidade, probidade, auxiliando-se mutuamente na formação e na execução das obrigações, bem como na interpretação do acordo; deve-se buscar ainda a real intenção das partes e o contexto em que foi celebrado o contrato em detrimento da literalidade do texto.
Além desses princípios, os contratos celebrados por meio eletrônico também são norteados por princípios específicos ao tema, quais sejam:
- 1. princípio da equivalência funcional entre os atos jurídicos produzidos por meios eletrônicos e os atos jurídicos produzidos por meios “tradicionais” – estabelece aos contratos realizados em meio eletrônico o mesmo reconhecimento e efeitos jurídicos conferidos aos contratos realizados de forma escrita ou verbal. Verifica-se a existência de vedação a qualquer diferenciação entre os contratos “tradicionais” e os contratos firmados em ambiente virtual. Assim, de forma alguma o contrato deve ser considerado inválido apenas por ter sido celebrado eletronicamente;
- 2. princípio da conservação e aplicação das normas jurídicas existentes aos contratos eletrônicos – aplicam-se aos contratos eletrônicos as mesmas regras relativas aos contratos tradicionais devido à semelhança existente entre ambos, bem como à inexistência de legislação específica que trata do assunto. Não é cabível oferecer tratamento diferenciado aos acordos virtuais, prevalecendo a igualdade entre ambos.
- 3. princípio da identificação – a fim de prevenir futuros conflitos e indagações, deve-se proceder à devida identificação das partes que celebram um contrato pela internet, de modo que ambas saibam com quem estão lidando, o que pode ser feito por meio de assinatura digital, dentre outras possibilidades;
- 4. princípio da verificação – por fim, todos os documentos eletrônicos relacionados com o pacto devem ser armazenados, possibilitando eventual verificação futura, preservando-se assim a prova da celebração contratual.
Assim, evidencia-se que os contratos eletrônicos são norteados não apenas pelos princípios gerais da contratação, mas também por princípios específicos dessa modalidade de acordo.
Requisitos de validade do contrato eletrônico
Para que os contratos eletrônicos tenham validade jurídica e surtam os efeitos pretendidos pelas partes, precisam observar os mesmos requisitos de validade dos contratos físicos.
Tendo em vista a inexistência de lei específica que disponha especificamente sobre os contratos eletrônicos, devem ser observados os requisitos estabelecidos aos negócios jurídicos em geral, apenas os adequando às particularidades dos contratos eletrônicos.
É imprescindível que as partes sejam capazes. Para tanto, deve-se verificar se os contratantes são maiores, têm condições físicas e psicológicas de assumirem as obrigações em questão.
Fundamental destacar que os contratos eletrônicos podem ser firmados entre um sujeito e um sistema automatizado ou até mesmo entre sistemas automatizados. Tais situações não invalidam o acordo, desde que o responsável pelo sistema seja civilmente capaz.
Outra exigência legal é o objeto lícito, possível, determinado ou determinável. Desse modo, o objeto do contrato eletrônico deve estar em conformidade com a legislação, deve ser viável o seu cumprimento, e deve conter especificação pelo menos quanto a gênero, qualidade, quantidade ou prever critérios para que ocorra tal especificação.
A legislação estabelece ainda que deve ser seguida a forma prescrita ou não defesa em lei. Em regra, a contratação ocorre de forma livre, como é o caso dos contratos virtuais, podendo se concretizar verbalmente, por meio de gestos, ou, como é mais comum e seguro, por escrito; no entanto, existem exceções em que são previstas formalidade específicas para validação do acordo.
Assim, se um contrato solene (que prevê tais formalidades específicas) for concluído em ambiente virtual, ele será inválido, pois as formalidades legais não estariam sendo atendidas.
COMO CELEBRAR UM CONTRATO ELETRÔNICO COM SEGURANÇA?
Apesar das inúmeras vantagens da comercialização online, muitas pessoas a evitam por considerarem-na arriscada. Preocupam-se com a validade do acordo, a possibilidade de reclamá-lo em juízo, a qualidade do produto ou do serviço contratado, a idoneidade da outra parte, o armazenamento dos dados pessoais dos contratantes, a autenticidade do conteúdo das mensagens enviadas, dentre outras questões.
Entretanto, a utilização de contratos eletrônicos devidamente redigidos, a assessoria de profissionais qualificados nesta temática, bem como a utilização de mecanismos de segurança reduzem consideravelmente os riscos enfrentados pelos contratantes.
Nessa senda, frise-se que os tribunais brasileiros já esclareceram em várias oportunidades que o contrato eletrônico com assinatura digital, mesmo sem testemunhas, é considerado um “título executivo extrajudicial”. Isso significa que, em caso de descumprimento, é muito mais célere o processo de cobrança do negócio.
Diante disso, a assinatura digital desempenha papel bastante relevante na identificação das partes e comprovação da autenticidade dos dados emitidos, garantindo segurança jurídica a todos os envolvidos e conferindo mais efetividade ao contrato.
Frise-se que assinatura digital se difere da assinatura digitalizada, que é manuscrita, escaneada e encaminhada via internet. Esta não possui validade jurídica, haja vista que pode ser facilmente fraudada, além de que pode ser utilizada mais de uma vez em vários documentos.
Para que haja assinatura digital válida, é imprescindível a utilização de certificado digital, que se trata de instrumento emitido por uma autoridade certificadora, como o Serasa, que garante autenticidade às assinaturas digitais. É um documento eletrônico, que identifica os usuários.
Ademais, há diversos outros sistemas de comprovação de identidade eletrônica, como código secreto, número de identificação pessoal, senha, cartão, impressão digital, leitura da retina, reconhecimento da escrita ou da voz, dentre outros.
Assinatura digital (ICP-Brasil)
O Brasil instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) a fim de organizar o reconhecimento dos documentos produzidos eletronicamente; dessa forma, a assinatura efetivada por meio de chaves privadas e reconhecida por chaves públicas tem validade perante terceiros.
Esse instituto é responsável pela expedição, distribuição, revogação e gerenciamento de certificados digitais. Suas atividade devem estar em conformidade com as diretrizes e as normas técnicas estabelecidas pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil. O par de chaves criptográficas será gerado sempre pelo próprio titular e sua chave privada de assinatura será de seu exclusivo controle, uso e conhecimento.
As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários. Por outro lado, não se obsta a utilização de outro meio de comprovação de autoria e integridade dos documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for apresentado o documento.
A assinatura eletrônica por meio do ICP-Brasil não é requisito de validade dos contratos eletrônicos, mas constitui ferramenta muito valiosa que auxilia a verificação da veracidade das informações.
CONTRATOS ELETRÔNICOS ENTRE EMPRESAS E CONSUMIDORES
(Business to consumer – b2c)
O comércio digital entre empresas e consumidores cresce a cada ano, pesquisas indicam que 7 a cada 10 brasileiros compram regularmente pela internet.
“Business-to-consumer”, como é chamada, consiste em uma relação jurídica de consumo firmada, através de um contrato eletrônico, entre uma empresa fornecedora e um consumidor. Essa contratação é regulada pelo Código de Defesa do Consumidor
Nesse contexto, o Decreto nº 7.692/13 dispõe sobre as relações de consumo no comércio eletrônico. Tal norma, a fim de conferir maior segurança ao consumidor, estabelece uma série de regras que devem ser observadas nas contratações realizadas no ambiente virtual, sob pena de quem as desobedecer incorrer em sanções administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor.
Esse decreto traz determinações não apenas para o contrato eletrônico em si, mas para toda a relação de negociação, como a obrigação de expor informações claras a respeito do produto, do serviço e do fornecedor. Objetiva oferecer atendimento facilitado ao consumidor.
Há ainda a obrigação de respeitar o direito de arrependimento, bem como de observar as condições da oferta, como a entrega dos produtos e serviços contratados em conformidade com prazos, quantidade, qualidade e demais especificidades acertadas.
Ressalte-se que o direito de arrependimento consiste na possibilidade do consumidor desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar da conclusão do acordo ou do recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial. Tal desistência independe da constatação de defeito, atraso ou qualquer outro problema do objeto do contrato.
Entre as sanções previstas para os contratos eletrônicos de consumo estão a pena de multa, apreensão do produto, proibição de fabricação do produto, suspensão temporária de atividade, cassação de licença do estabelecimento ou de atividade, imposição de contrapropaganda.
Contratos Eletrônicos entre empresas (Business to business- b2b)
Ademais, outra modalidade de contratação eletrônica bastante presente em nossa sociedade é a realizada entre empresas. Trata-se da efetivação do negócio jurídico entre empresas, no qual uma estará sendo a fornecedora dos produtos ou serviços e a outra a receptora dos mesmos.
Nessa relação comercial, diferentemente da anteriormente analisada, aplica-se, em regra, as normas relativas ao direito civil, tendo em vista que as partes são pessoas jurídicas empresárias, envolvidas em uma relação comercial.
Contudo, isso não é absoluto. A comercialização entre uma multinacional e uma microempresa, por exemplo, pode configurar uma relação de desigualdade entre as duas partes, sendo esta hipossuficiente em relação àquela. A depender das peculiaridades concretas, nesta hipótese é possível a aplicação da legislação consumerista.
A Importância de uma Boa Assessoria Jurídica
Como exposto, elaborar um bom contrato eletrônico requer a observância de uma série de especificidades. Além disso, é necessário estruturar um complexo sistema de proteção que garanta segurança jurídica tanto para empresa quanto para o cliente.
Ademais, os riscos de utilizar contratos eletrônicos mal elaborados são grandes e evitá-los não é uma tarefa fácil. Exatamente por isso que é importante ter uma assessoria jurídica especializada para auxiliar nessa função.
O mercado digital cresce a cada ano, estar devidamente preparado para realizar contratações virtuais não é uma necessidade do futuro, mas do presente. Se sua empresa ainda não oferece produtos/serviços onlines, não perca mais tempo e passe a explorar esse amplo mercado.
Nesse ponto, é possível concluir que a assessoria jurídica representa um investimento que vale a pena e que pode ser essencial para o crescimento saudável de empresas de todos os portes. Principalmente em momentos de crises e cortes de gastos, esse tipo de serviço possibilita a reorganização e a consolidação do empreendimento.
Fonte: CHC Advogados
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Marisa Vendruscolo
É Advogada Tributarista e Bacharela em Direito pela Universidade Cesumar de Maringá. Conciliadora Judicial pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Capacitação em Fundamentos da Mediação Comunitária, pela Escola Nacional de Mediação e Conciliação (ENAM). Capacitação em Mediação Judicial ( NUPEMEC/PR e CNJ). Capacitação em Justiça Restaurativa pela Universidade Estadual De Maringá/PR (UEM).Cursou Licenciatura em Química pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Cursando Pós Graduação em Docência do Ensino Superior pela Faculdade FAVENI.